por Raphael
Tsavkko Garcia
Participei
ontem dos maiores protestos que já vi agitarem o país. Ou, ao menos, que eu
tenha tido o imenso prazer de participar. Paramos o país de norte a sul.
Éramos 100
mil no Rio, mais de 100 mil em São Paulo (o movimento que começou no Largo da
Batata se dividiu em vários "menores", um deles ocupou toda a
Brigadeiro Luis Antônio da JK até a Paulista, só ali éramos mais do que os 60
mil totais divulgados pela mídia), mais de 20 mil em Belém, milhares em Brasília,
PoA, Maceió, BH, Vitória, Londrina, Juiz de Fora, Caruaru, Santos... Em dezenas
de cidades no Brasil e no mundo.
Mas por quê?
A revolta não
nasceu por causa de 20 centavos, 10 centavos, nem 30 centavos. Ela tão somente
ESTOUROU depois dos aumentos simultâneos em todo o país. Enquanto o PT prega que o país está indo às mil maravilhas, o
povo nas ruas mostrou que esta imagem não é real. Não estamos sorridentes com a
Copa, não estamos felizes com a educação, com a cultura, com a saúde...
Protestos
contra o aumento se juntaram a protestos contra os gastos absurdos da Copa, com
a insatisfação com a cidade, com a exclusão social, com as tentativas de golpe
contra o judiciário patrocinadas pelo PT e
aliados, como no caso da PEC37,
contra a violência policial, contra a educação e saúde precárias...
Enfim, o povo
foi às ruas contra o atual modelo de país que temos, excludente, desigual, com
bilhões fluindo para a FIFA e para
obras faraônicas e virtualmente inúteis, em protestos reprimidos com extrema
violência e brutalidade, enquanto somos bombardeados por propagandas estatais
de que "está tudo bem", "está tudo lindo". Não está.
Indígenas são
massacrados e desrespeitados em suas terras, na verdade muitos sequer tem
terras. LGBTs são assassinados nas ruas
por simplesmente serem quem são, a periferia grita contra o genocídio que
sofre, e toda a população se revolta contra a submissão a uma política de
iguais, sem opções, em que PSDB e PT se revezam em acusações, mas são apenas faces da
mesma moeda: Corruptos, privatistas, entreguistas, preocupados em enriquecer
aos seus e não em transformar o país.
Não há imagem
mais emblemática que o povo ocupando o Congresso. Pacífico, apenas demonstrando
sua força e que quem deve ter medo é o poder, são os governos, e não o povo. O
governo nos serve, deve nos servir e deve nos temer.
Estamos
diante de uma onde sem precedentes de conservadorismo, de medievalismo
religioso, de tentativas de destruir o judiciário ao invés de reformá-lo e
torná-lo mais democrático. O povo estourou contra um congresso e legislativos
corruptos, desconectados da realidade do povo. Enquanto pegamos ônibus, metrôs
e trens lotados, políticos impõem suas pautas pessoais usando carros de luxo
pagos com nosso dinheiro e vivem em mansões inalcançáveis para a ampla maioria
da população.
Lutamos e
fomos às ruas por dignidade. Por respeito.
Em São Paulo o que mais víamos eram cartazes contra a PEC37, a favor de um transporte público de
qualidade e gratuito para todxs, e por respeito aos nossos direitos.
Sim, lutamos por
direitos. Por direitos básicos, para não sermos joguete nas mãos de partidos
iguais, que nada propõem, que em nada se diferenciam.
Falando
especificamente de São Paulo, Haddad recuou, Alckmin recuou. A não-violência ontem se deve
exclusivamente à escassa presença da PM nas ruas, pois como todos sabemos, a
presença da PM é um convite para a violência e a brutalidade. Não importa se a
manifestação é pacífica, a PM sempre encontra razão (sic) para exercer seu
"direito" de nos violentar.
Haddad que havia apoiado a
violência da PM foi forçado a mudar o
discurso, mas não o suficiente para OBEDECER os paulistanos e reduzir a tarifa.
Pelo visto ele terá de ser convencido nas ruas de que nós pagamos o salário
dele e nós é que mandamos. Alckmin, por sua vez, foi forçado a mandar a PM
recuar, e também terá de ser convencido nas ruas a obedece ao povo que mostrou
ter forças e vontade.
Agora, porque
todas essas manifestações pelo país?
Em primeiro
lugar, temos a insatisfação com a Copa, com os gastos absurdos,
mas este não foi o estopim, tão somente o pano de fundo. Foi, digamos,
combustível para a insatisfação popular que estourou de vez com mais uma
demonstração de incapacidade política de Dilma e
aliados.
Em segundo
lugar, com a violência patrocinada por governos e prefeituras coniventes e por
uma mídia canalha que se viu forçada a mudar de lado depois que ela própria se
viu vítima da violência estatal.
E em terceiro
lugar, com os problemas diários e corriqueiros do país: Educação, saúde,
cultura...
Em várias
cidades do país os aumentos das passagens ou seus anúncios vieram praticamente
ao mesmo tempo. Dilma fez
com que políticos de seu partido e aliados segurassem os aumentos e, no fim,
vários vieram ao mesmo tempo.
Conversei
sobre isso ontem com o Maringoni durante
o protesto, e a falta de habilidade de Dilma foi
impressionante. Uma tecnocrata incapaz de pensar politicamente. Não à toa, a
declaração dela sobre os protestos, repassada por sua secretaria, é risível.
Um(a)
político(a) sério(a) teria tido a capacidade de compreender o alcance de
tamanha burrada.
Se a
data-base de diversas categorias vem em datas diferentes, é porque se fossem na
mesma época teríamos greves gerais. Então qual o sentido em comandar aumentos
simultâneos em todo o país?
Além de
demonstrar incapacidade política, também demonstra que o PT e aliados acham que o povo é estúpido, dócil,
subserviente e acomodado.
A lição foi
dada nas ruas.
As pautas são
muitos, as reivindicações são muitas e nenhuma delas é corrente, na verdade são
complementares. Queremos um novo modelo de país, humano, justo, para nós,
brasileiros (e quem mais more aqui, lógico), e não para a farra de turistas que
virão durante a copa e depois irão embora.
O PT não consegue compreender o que acontece e usa sua
claque de fanáticos para tentar desmobilizar e até mesmo cooptar a massa. E
falham miseravelmente.
Como eu havia
dito ontem, aqui no blog, uma parcela considerável, senão a maioria dos manifestantes
nunca protestou, nunca se mobilizou e, no caso dos jovens, não se vê
representado pelo PT e muito
menos cai na tese do "mal maior" usada pelo PT. A geração que está nas ruas em peso nunca viveu
sob FHC, ou seja, o discurso do PT não cola mais. Não adianta ficar se comparando ao
que os jovens não conheceram, é preciso mostrar trabalho, se mostrar novo e
o PT não tem conseguido fazer
isso. Na verdade, nenhum dos partidos consegue.
E é preciso
ter em mente que o Brasil não é uma ilha. Protestos pipocam pelo mundo.
Indignados, contra austeridade, contra ditaduras, por liberdade, contra
islamização... São pautas que parecem diferentes, mas tem o mesmo cerne: A
insatisfação da população, em especial da juventude, com a política
institucional e tradicional, a descrença em relação aos partidos e a busca por
mudanças sociais efetivas e reais.
Propagandas
na TV mostrando como o SUS é
maravilhoso, como a educação melhora e etc contrastam com a simples realidade.
Temos hospitais sucateados e atendimentos que levam anos, temos UniEsquinas
pipocando e precarização da força de trabalho. O país não está bem, o país não
é o que vemos nas propagandas dos governos, de todos eles.
O PT e o PSDB deixaram
claro que não são capazes de nos dar o que queremos, pelo contrário, não nos
representam. Nem eles e nem aqueles de seus partidos satélites. Discursos
vazios de políticos que legislam apenas por interesses próprios não nos servem.
Se não aprenderem, os protestos continuarão.
Nosso grande
desafio é conseguir manter a população mobilizada e pressionar os governos,
todos eles.
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