"As ruas fervem em todo o Brasil. Jovens, e outros nem tanto, ocupam as cidades que o capital teima em tentar monopolizar para seu gozo exclusivo, exigindo transportes mais baratos e, cada vez mais, direito à livre manifestação. Com muito vinagre e fogo no lixão urbano, os manifestantes rebelados afrontam as bombas de gás, balas de borracha, e outras nem tanto, da repressão policial. Nos (tele)jornais, querem dirigir o que não puderam evitar, apresentando um vilão fantasmático: “a corrupção!”, para tentar desviar o foco da materialidade das contradições sociais que emergem com as centenas de milhares de pessoas nas ruas. Para eles, há os pacíficos e os vândalos. Bandeiras nacionais e hinos patrióticos representam a “verdadeira cidadania”, os partidos de esquerda seriam os “aproveitadores”. A linha é tênue, e varia conforme os humores dos manifestantes e as “sondagens de opinião”. Há quem, nas próprias manifestações, reproduza valores desse esforço ideológico para direcionar as mobilizações para a zona de conforto da classe dominante. Mas, os jornalistas dos monopólios da comunicação precisam se refugiar nos helicópteros e estúdios, porque sabem que a maioria ali não acredita no que dizem e nas ruas podem também ser brindados com o escracho dos que lutam. Lutam pelo que? O que explica a explosividade e a rapidez surpreendentemente desses acontecimentos? Aonde podem chegar? Qual o seu potencial? E os limites que precisam ultrapassar?" - Com esta breve introdução iniciamos nosso blog em junho de 2013. A luta continua e por isso este espaço continua aberto às analises!

sábado, 23 de novembro de 2013

Sem respostas para o transporte, governos não abrem mão de reprimir lutas sociais

ESCRITO POR GABRIEL BRITO E LEANDRO IAMIN, DA REDAÇÃO do CORREIO DA CIDADANIA 
SEXTA, 22 DE NOVEMBRO DE 2013



Após realizar sua jornada de lutas no final de outubro, o MPL (e bairros em crescente organização) segue pautando o debate dos transportes públicos em São Paulo, enquanto a prefeitura mantém-se em sua morosidade em oferecer políticas mais incisivas contra a caótica situação atual. Ao lado disso, com grande contribuição do governo estadual tucano, mantém-se a criminalização de todo e qualquer movimento que se manifeste de forma claramente contrária aos interesses econômicos dominantes.

“O importante é a gente entender que existe uma criminalização de fato, e essa criminalização recai em cima de quem está se manifestando, de quem está tentando mudar as coisas e de quem é pobre, daqueles que a princípio o sistema quer excluir, inclusive por serem pessoas que se opõem a tal sistema”, disse Marcelo Hotimsky, militante do Movimento pelo Passe Livre, em entrevista ao Correio da Cidadania. “Na verdade, esse caso é exemplar de como o confronto não acontece por uma postura específica na manifestação, por quebrar alguma coisa etc. Acontece quando existe interesse por parte da burguesia, ou por parte de sua polícia, em reprimir uma manifestação”,  reitera Marcelo, tomando como exemplo a manifestação realizada no Grajaú.

Além de explicar um pouco mais sobre o polêmico ato de 25 de outubro, quando dezenas de militantes, e sua banda de música, foram detidos arbitrariamente, Marcelo concorda com a ideia de que a mídia contribui para a descaracterização dos movimentos que têm ido às ruas, abrindo caminho para justificativas de repressão e violência estatal, uma marca da qual o Estado brasileiro não parece pronto para abrir mão.

E, sem deixar de renovar os debates do campo de atuação do MPL, Marcelo critica as respostas oferecidas pela prefeitura no que se refere aos ônibus. Diz que os corredores que vêm sendo construídos, apesar de auxiliarem na mobilidade, também contemplam interesses dos empresários do setor, que ao mesmo tempo continuam cortando linhas periféricas de diversas regiões, com a anuência de Haddad e cia.

“Na realidade, temos uma avaliação bem negativa das respostas que foram dadas até agora. Porém, o que podemos ver do atual momento, pelas próprias políticas que estão sendo implementadas pela prefeitura, é uma reação das populações dos bairros, como é o caso de São Mateus, onde o pessoal começou espontaneamente a se manifestar contra o corte de linhas”, afirma.

A entrevista completa com Marcelo Hotimsky, mais uma realizada em parceria com a webrádio Central3, pode ser lida a seguir.

Correio da Cidadania: Como você avalia a jornada de lutas do MPL, realizada entre os dias 21 e 28 de outubro, com manifestações em diversas regiões periféricas da cidade pela tarifa zero e também um transporte público melhor no geral?

Marcelo Hotimsky: A nossa avaliação é bem positiva. Eu acho que a jornada foi muito bacana e, no seu término, no ato pela tarifa zero, na sexta-feira 25 de outubro, conseguiu reunir duas pautas que para nós são muito importantes: primeiro, a tarifa zero, para o transporte ser de fato um direito; em segundo, o transporte planejado de acordo com os interesses e as necessidades da população, o que se reflete nos atos que foram feitos anteriormente na periferia pela volta de linhas que vêm sendo cortadas, por transportes 24 horas, por extensões de linhas de metrô. Enfim, questões que foram levantadas pela própria população sobre como deve ser o transporte nessas regiões.

Na verdade, a gente junta as duas pautas justamente porque, tanto pelo fato de existir tarifa quanto de as linhas serem cortadas, além de não ter ônibus 24 horas e todas as coisas sobre as quais a população estava reclamando no seus bairros, são todas estas consequências de um transporte sustentado como mercadoria, não como direito.

Nesse sentido, pensamos que a luta foi muito boa, conseguiu ir para dentro dos bairros. Foi muito legal ver que na mesma semana um pessoal em São Mateus, na zona leste, começou a se mobilizar contra o corte de linhas. Portanto, a jornada não acabou na data inicialmente marcada por nós, pois, na semana seguinte, vimos novos atos no Campo Limpo e em São Mateus, os dois contra o corte de linhas de ônibus da região.

Correio da Cidadania: O que você comentaria do ato mais divulgado pela mídia, do dia 25, no centro de São Paulo, com todas as escaramuças de rua, a polêmica agressão ao coronel, as prisões etc.?

Marcelo Hotimsky: Eu acho que naquele dia vimos muito bem como está acontecendo uma escalada repressiva forte, a polícia prendeu muitos participantes das manifestações, estavam de fato procurando os manifestantes. Foi bem complicado. O final do ato foi meio conturbado por conta disso.

Acho que também está claro o quanto a polícia agride as manifestações, não por conta de qualquer evento como o que aconteceu com o coronel, mas porque é a função da polícia.  O que ficou claro pelo simples fato de a polícia ter começado a jogar bombas e perseguir os manifestantes depois de o ato ter acabado. A gente fez um jogral encerrando o ato, na Praça da Sé, e depois dissemos a todos para irem embora, pois o ato já tinha terminado. Mesmo assim, a polícia começou a jogar bombas e perseguir os manifestantes.

Correio da Cidadania: Concorda com a tese de que existe um conluio entre instituições e ocupantes do poder, alimentado pela mídia, de criminalização do protesto social, sob a desculpa do “vandalismo”?

Marcelo Hotimsky: Achamos que a mídia tem um papel bem complicado ao ajudar nessa criminalização do movimento social. Desde junho, a mídia acabou impondo uma separação entre manifestantes “pacíficos” e “vândalos”, muito prejudicial às manifestações.

A mídia tem jogado grupos de manifestantes contra outros manifestantes, enfim, tem, de certa forma, coibido certos grupos de participar das manifestações. Assim é o caso da polêmica com os mascarados, agora sob diversas proibições do uso de máscara em manifestações. Todo mundo que participa das manifestações e que já sofreu ameaça de polícia sabe que é uma forma de o manifestante se proteger.

Correio da Cidadania: Vimos que, logo depois da comoção em torno da agressão ao coronel da PM, a polícia executou, banalmente, um jovem na Vila Medeiros, zona norte. Que paralelo você faz entre a soltura do assassino de farda e a manutenção na cela, por vários dias, de um dos manifestantes do dia 25, Paulo Henrique, de 22 anos?

Marcelo Hotimsky: Eu acho que os dados falam por si só. O importante é a gente entender que existe uma criminalização de fato, e essa criminalização recai em cima de quem está se manifestando, de quem está tentando mudar as coisas e de quem é pobre, daqueles que, a princípio, o sistema quer excluir, inclusive por serem pessoas que se opõem a tal sistema.

Isso que é complicado. Mas, na verdade, não é novidade. Em junho vivemos o mesmo, muito fortemente. Mesmo dentro da criminalização dos próprios manifestantes, temos aqueles casos conhecidos, a exemplo das cenas explícitas que vimos de um filho de empresário dos transportes quebrando a porta da prefeitura. Esse rapaz foi solto no dia seguinte. Ao mesmo tempo, uma mulher negra, moradora de ocupação do centro, ficou presa três meses, por ter sido pega roubando material higiênico durante um ato.

Eu penso que tal cenário evidencia bem como o sistema judicial serve para atender certos interesses dominantes da sociedade, enquanto segue excluindo os que já são os mais excluídos.

Correio da Cidadania: O que o MPL, por experiência própria, pode falar da ação policial quando seus atos pela tarifa zero são realizados na periferia?

Marcelo Hotimsky: A maioria dos atos foi tranquila. Porém, no caso do Grajaú, é bom relembrar um caso especialmente interessante, porque foi o único ato na periferia que teve repressão, entre todos os atos da jornada. Mas a repressão de lá foi muito clara. Primeiro, os perueiros e funcionários das próprias empresas de ônibus e peruas tentaram acabar com a manifestação. Depois, a polícia, sem que tivesse acontecido qualquer grande problema na manifestação, foi lá e jogou um carro em cima dos manifestantes.

A partir do momento em que eles jogaram o carro em cima dos manifestantes, chegando a atropelar um deles, as pessoas ficaram bravas, chegaram a bater no carro da polícia, que logo usou a atitude como justificativa para iniciar o confronto.

Na verdade, esse caso é exemplar de como o confronto não acontece por uma postura específica na manifestação, por quebrar alguma coisa etc. Acontece quando existe interesse por parte da burguesia, ou por parte de sua polícia, em reprimir uma manifestação.

Acho que, no caso do Grajaú, esse contexto ficou muito evidente, porque as reivindicações que a população está fazendo lá vão diretamente contra os interesses dos empresários de ônibus, da prefeitura etc. Exigiriam um gasto a mais com o transporte público de tais pessoas, o que, de fato, eles mostraram que não têm interesse em atender.

Correio da Cidadania: Após algumas vitórias e uma inédita repercussão dos debates a respeito do transporte público, como vocês avaliam, até agora, as respostas práticas do poder público, de todas as esferas, em termos de políticas direcionadas ao transporte?

Marcelo Hotimsky: Na realidade, temos uma avaliação bem negativa quanto às respostas que foram dadas até agora. A gente acha, sim, que a reversão do aumento da tarifa foi de importância extrema. Mas foi de grande importância justamente porque veio da parte da população, não porque a prefeitura decidiu não reajustar.

A população obrigou a prefeitura a recuar. Foi gerada uma situação de tamanha pressão popular, com as pessoas dizendo que não iriam aceitar o aumento da tarifa, que a prefeitura teve de mudar sua posição. É isso que defendemos para tudo que seja feito em termos de transportes. No entanto, vemos que as medidas atuais não foram tomadas nesse sentido. Achamos que toda a mudança do transporte coletivo deve ser feita de acordo com o interesse da população.

Assim, a prefeitura pode até justificar que o corte de linha é tecnicamente melhor, que pode ser mais barato... Mas o grande problema é esse: em nenhum momento o usuário foi perguntando sobre os cortes de linha. E o que estamos vendo, obviamente, é que o usuário não quer os cortes. Não quer ter de pegar mais de um ônibus, quando fazia o trajeto com um ônibus só.

No geral, temos essa avaliação a respeito de todas as medidas que estão sendo tomadas pela prefeitura. Por mais que existam alguns dados positivos, como no caso das faixas exclusivas de ônibus, não se trata de medidas que confrontem diretamente os interesses desse empresariado. Pelo contrário, mais corredores de ônibus é uma medida até conciliatória. Tanto que não se vê a prefeitura anunciando que vai colocar mais ônibus em circulação, que vai colocar mais linhas dentro das periferias, medidas que iriam contra o interesse desses mesmos empresários.

Correio da Cidadania: Como o movimento pretende seguir pautando o debate político, mais especificamente em sua área de atuação, nos próximos tempos?

Marcelo Hotimsky: O MPL sempre se organizou do mesmo jeito. Sempre estivemos nas periferias junto com os movimentos sociais, nos colégios públicos, nas associações de moradores, discutindo em cada região o que pessoas querem do transporte local e fazendo mobilizações. Sempre com a pauta da tarifa zero, como dito no começo. Portanto, não é uma demanda do MPL. A população traz o debate.

Porém, o que podemos ver do atual momento, pelas próprias políticas que estão sendo implementadas pela prefeitura, é uma reação das populações dos bairros, como é o caso de São Mateus, onde o pessoal começou espontaneamente a se manifestar contra o corte de linhas.

Eu acredito que o grande ponto dos próximos atos será o corte de linhas - na verdade, uma política antiga da prefeitura, que na zona sul já acontece há algum tempo. Tanto é que as manifestações que aconteceram na semana de lutas, na zona sul, tinham como um dos principais focos, nos diversos bairros, a volta de linhas que foram cortadas por conta da criação dos terminais, como os terminais Jardim Ângela e Campo limpo. Antes, existiam linhas que iam até depois de tais terminais, e agora é preciso pegar dois ônibus até o terminal, depois pegar mais uma fila, mais um ônibus, só pra catraca rodar de novo e o empresário lucrar mais.

Essa tem sido a política sistemática da prefeitura e a gestão Haddad, pelo que está indicando, ampliará tal tipo de política. Portanto, o corte de linhas, no momento, está sendo um ponto central de mobilização em torno do transporte.


Leia também:

Gabriel Brito e Leandro Iamin são jornalistas.

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Marcos defende anarquistas e critica “moderninhos” e esquerda “bem-comportada”

No informe intitulado "Más e não tão más notícias", subcomandante se posiciona diante da ofensiva “anti-anarquista que levantam as boas consciências e a 'esquerda bem-comportada', unidas na santa cruzada com a direita ancestral para acusar jovens e velh@s anarquistas"
05/11/2013
Marcelo Netto Rodrigues
da Redação

Em comunicado divulgado no dia 3 de novembro, o subcomandante Marcos defendeu anarquistas e black blocs e mandou um recado para os “moderninhos”, com os seus “ismos”, e para a esquerda “bem-comportada”.
No informe intitulado “Más e não tão más notícias”, Marcos se posiciona diante da ofensiva “anti-anarquista que levantam as boas consciências e a 'esquerda bem-comportada', unidas na santa cruzada com a direita ancestral para acusar jovens e velh@s anarquistas por desafiarem o sistema (como se o anarquismo tivesse outra opção)”.
Entre detalhes operacionais de quanto custou a primeira etapa da Escuelita Zapatista, realizada em agosto com 1.281 pessoas de todo o mundo, e ataques às “reformas estruturais” de fachada prometidas pelo governo mexicano, o porta-voz zapatista refez o convite para que outros venham participar da segunda etapa da escuelita, prevista para acontecer no final de dezembro deste ano. Com um detalhe:
“Venham, mas venham para escutar e aprender, porque houve quem veio [na primeira etapa da escuelita] para querer dar aulas de feminismo, vegetarianismo, marxismo e outros 'ismos'. E agora estão desgostosos porque os zapatistas não obedecemos o que nos vieram ensinar: que devemos mudar a lei revolucionária de mulheres como elas dizem e não como decidam as zapatistas; que não entendemos as vantagens da maconha; que não façamos nossas casas de cimento porque é melhor com adobe e palha; que não usemos calçados porque ao andar descalço estaríamos mais em contato com a mãe-Terra. Enfim, que obedeçamos o que nos vem a ordenar... ou seja, que não sejamos zapatistas.”
Quanto à ofensiva contra os anarquistas, a quem acusam “de serem os responsáveis por tudo o que está acontecendo”, Marcos os convidou a escreverem, no momento da inscrição para a segunda etapa da escuelita, uma folha de papel, ou ao menos uma palavra, sobre as acusações que lhes estão sendo impostas.
“Compas anarquistas: nós, @s zapatistas, não vamos culpabilizá-los por nossas deficiências […], nem vamos lhes fazer responsáveis pelos nossos erros, nem muito menos, vamos persegui-los por serem quem são. Mais ainda, lhes conto que vários convidados em agosto cancelaram sua vinda porque disseram que não podiam compartilhar a aula com “jovens anarquistas, esfarrapados, punks, cheios de brincos e tatuagens”, que esperavam (os que não são jovens, nem anarquistas, nem esfarrapados, nem punks, nem cheios de brincos e tatuagens) uma desculpa e que se aperfeiçoasse a inscrição. Seguem esperando inutilmente.
O que queremos lhes pedir é que, no momento da inscrição, entreguem um texto, no máximo de uma folha de papel, onde respondam às críticas e acusações que lhes têm feito os meios de comunicação pagos. Este texto será publicado numa seção especial de nossa página eletrônica (enlacezapatista.ezln.org.mx) e em uma revista-fanzine-como-se-diga que está prestes a aparecer no mundo mundialmente mundial, dirigida e escrita por indígenas zapatistas. Será uma honra para nós que em nosso primeiro número esteja sua palavra junto a nossa.
Vale uma folha só com uma palavra que abarque todo o espaço: algo como “Mentem!”. Ou algo mais extenso como “Eu lhes explicaria o que é o anarquismo se pensasse que iam entender”; ou “O anarquismo é incompreensível para os anões do pensamento”; ou “As transformações reais primeiro aparecem na nota vermelha”; ou “Tô cagando com o policiamento do pensamento”; ou a seguinte citação do livro “Golpes e contra-golpes”, de Miguel Amorós: “Todo mundo deveria saber que o Black Bloc não é uma organização, sim uma tática de luta de rua similar à 'kale borroka', que uma constelação de grupos libertários, “autônomos” ou alternativos vinha praticando desde as lutas dos squats (“okupações”) nos anos 80 em várias cidades alemãs' e agregar algo como 'se vão criticar algo, primeiro investiguem bem. A ignorância bem redigida é como uma idiotice bem pronunciada: inútil igual.”
Leia a íntegra em espanhol do comunicado abaixo ou clique aqui:

 MALAS Y NO TAN MALAS NOTICIAS.
 Noviembre del 2013.

A l@s estudiant@s que tomaron o quieren tomar el primer nivel de la Escuelita Zapatista:
A quien corresponda:
Compañeros, compañeras y compañeroas

Pues como ya es costumbre, me han designado a mí para darles las malas noticias.  Así que ahí les van.
PRIMERO.- Las cuentas (ahí les encargo que chequen bien las sumas, restas y divisiones porque las matemáticas no son mi fuerte, quiero decir, tampoco son mi fuerte):
A).- Gastos del primer nivel en Agosto de 2013 para 1281 alumnos:
.- Material de apoyo (4 libros de texto y 2 Dvd´s) para 1281 alumnos: $100,000.00 (cien mil pesos m/n).
.- Transporte y alimentación para 1281 alumnos del CIDECI a la comunidad en que tomaron el curso y de regreso: $ 339,778.27 (trescientos treinta y nueve mil setecientos setenta y ocho pesos con veintisiete centavos), repartidos de la siguiente forma:
Gastos de cada Zona en llevar alumn@s del CIDECI y distribución  en cada pueblo en carros y regresarlos a CIDECI, además de alimentación de niñ@s que trajeron l@s alumn@s.
Realidad ————-  $    64,126.00
Oventik—————- $   46,794.00
Garrucha————–  $ 122,184.77
Morelia—————-  $   36,227.50
Roberto Barrios—-     $   70,446.00
Total general—–        $ 339,778.27
  Nota: Sí, a mí también me llamó la atención eso de “77 centavos”, pero así me pasaron la cuenta.  O sea que no estamos en la onda del redondeo.
.- Transporte de 200 guardianas y guardianes al CIDECI donde impartieron el curso y de regreso: $ 40,000.00 (cuarenta mil pesos).  Su alimentación fue cubierta por l@s compañer@s del CIDECI-Unitierra.  Gracias al Doc Raymundo y a tod@s l@s compas de CIDECI, especialmente a l@s de la cocina (ojo: me deben los tamales).
  Total de gasto de las comunidades zapatistas para el curso de primer nivel en agosto del 2013 para 1281 alumnos: $ 479, 778.27 (cuatrocientos setenta y nueve mil setecientos setenta y ocho pesos con veintisiete centavos).
    Gasto promedio por alumno: $ 374.53 (trescientos setenta y cuatro pesos con cincuenta y tres centavos m/n).
B).- Ingresos de la Escuelita Zapatista:
Ingresos por registro (el bote que estaba en CIDECI): $ 409,955.00 (cuatrocientos nueve mil novecientos cincuenta y cinco pesos m/n).
Moneda nacional: $ 391, 721.00
Dólares: $ 1,160.00
Euros: $ 175.00
                        Ingresos en promedio por pago de registro de cada alumno: $ 320.02 (trescientos veinte pesos con dos centavos).
SEGUNDO.- Resumen y consecuencias:
En promedio, a cada alumno se le apoyó con $54.51 (cincuenta y cuatro pesos con cincuenta y un centavos m/n), mismos que fueron cubiertos gracias a donaciones solidarias.  Es decir, se apoyaron entre alumn@s.
O sea que, como quien dice, no sale la paga, compas.  Fue gracias a que algun@s alumn@s dieron más de los cien pesos obligatorios (algun@s no pusieron nada) y a las donaciones de personas generosas, que apenas pudimos salir a mano.
A l@s que dieron de más y a quienes hicieron esas donaciones extraordinarias, les agradecemos de corazón. Y también deberían agradecerles quienes no pagaron los cien pesos completos o no dieron absolutamente nada.
Pero sabemos bien que es difícil que se repita esto y que algun@s asistentes les paguen el curso a otr@s, así que nos enfrentamos a las siguientes opciones:
a).- Cerramos la escuelita.
b).- Reducimos el cupo a lo que podamos cubrir l@s zapatistas.  Me dice el Subcomandante Insurgente Moisés que serían unos 100 por caracol, 500 en total.
c).- Subimos el costo y lo ponemos obligatorio.
Pensamos que no debemos cerrar la escuelita porque ella nos ha permitido conocer y que nos conozca gente que antes no conocíamos ni nos conocía.
Pensamos que si reducimos el cupo, pues much@s se van a quedar tristes o brav@s porque ya tienen todo preparado para asistir, y qué tal que quedan fuera.  Sobre todo ahora que ya saben que la esencia del curso está en las comunidades y l@s guardian@s.  Y bueno, como a mí tocaría dar la noticia, pues me redundarían las mentadas que no son de menta.
Entonces pues sólo queda pedirles que paguen lo de su transporte-alimentación.  Sabemos que eso, además de que va a molestar a algun@s, puede dejar fuera a vari@s más. Por eso les avisamos con tiempo para que vean la forma de completar su paga y/o la de sus compas que quieren y pueden asistir pero no completan.
El costo será ahora de $ 380.00 (trescientos ochenta pesos m/n) por estudiant@ y deberá ser cubierto en el momento de registrarse en el CIDECI los días señalados.  Si además quieren traer un kilo de frijol y uno de arroz, pues se les agradecería.
Por favor, les suplicamos, les rogamos, les imploramos que aclaren bien con quiénes vienen, cuántos son y edades, porque luego llegan correos que dicen “voy con mis hijos” y ya que llegan olvídate del casting para “The Walking Dead”.  Tod@s l@s que asistan, deben registrarse antes, sean niñ@s, adultos, más mayores, muertos vivientes.
  Y aclaren las fechas en las que asisten.  Hay 2 fechas ahora, una a finales de diciembre y otra a inicios de enero.  Es importante saber a cuál se inscriben porque, como ya saben, hay una familia indígena que se prepara para recibirl@ y atenderl@, un guardián o guardiana que se prepara para orientarl@, un chofer o chofera que alista su vehículo para transportarl@, un pueblo entero que l@ recibe.  Y aclaren también si vienen a comunidad o tomarán el curso en el CIDECI de San Cristóbal de Las Casas, Chiapas.
Ah, y vengan a escuchar y aprender, porque hay quien vino a impartir cátedras de feminismo, vegetarianismo, marxismo y otros “ismos”.  Y ahora están a disgusto porque los zapatistas no obedecemos lo que nos vinieron a enseñar: que debemos cambiar la ley revolucionaria de mujeres como ellas dicen y no como decidan las zapatistas, que no entendemos las ventajas de la mariguana, que no hagamos las casas de cemento porque es mejor con adobe y paja, que no usemos calzado porque al andar descalzos estamos más en contacto con la madre tierra.  En fin, que obedezcamos lo que nos vienen a ordenar… o sea, que no seamos zapatistas.

CASOS ESPECIALES: L@s Anarquistas.
   Vista la campaña Anti Anarquismo que levantan las buenas conciencias y la izquierda bien portada, unidas en santa cruzada con la derecha ancestral para acusar a jóvenes y viej@s anarquistas de desafiar al sistema (como si el anarquismo tuviera otra opción), además de descomponer sus escenografías (¿lo de apagar la luz es para no ver a l@s anarquistas?), y que es llevada al delirio con calificativos como “anarco-halcones”, “anarco-provocadores”, “anarco-porros”, “anarco-etcétera” (por ahí leí el calificativo de “anarco-anarquista”, ¿no es sublime?), las zapatistas, los zapatistas no podemos ignorar el clima de histeria que, con tanta firmeza, demanda y exige que se respeten los cristales (que no muestran sino ocultan lo que pasa justo detrás del mostrador: condiciones laborales esclavistas, nula higiene, mala calidad, bajo nivel nutricional, lavado de dinero, defraudación fiscal, fuga de capitales).
Porque ahora resulta que esas raterías mal disimuladas llamadas “reformas estructurales”, que el despojo laboral al magisterio, que la venta “outlet” del patrimonio de la Nación, que el robo que el gobierno perpetra contra los gobernados con los impuestos, que la asfixia fiscal – que favorece sólo a los grandes monopolios-, que todo es por culpa de los anarquistas.
Que la gente bien ya no sale a las calles a protestar (oiga, pero si ahí están las marchas, los plantones, los bloqueos, las pintas, los volantes. Sí, pero son de maestr@s-transportistas-ambulantes-estudiantes-o-sea-nacos-y-nacas-y-de-provincia, yo digo gente bien-bien-del-df. -Ah, la mítica clase media, tan cortejada y al mismo tiempo despreciada y defraudada por todo el espectro mediático y político-), que la izquierda institucional también despoja los espacios de manifestación, que el “único opositor al régimen” ha sido opacado por los sin nombre una y otra vez, que a la imposición arbitraria se le llama ahora “diálogo y negociación”, que el asesinato de migrantes, de mujeres, de jóvenes, de trabajadores, de niñ@s, que todo es por culpa de los anarquistas.
Para quienes militan y se reivindican como de la “A”, bandera sin nación ni fronteras, y que son parte de la SEXTA, pero que en verdad militen y no sea una moda de vestir o de calendario, tenemos, además de un abrazo compañero, un pedido especial:
Compas Anarquistas: nosotros los zapatistas, nosotras las zapatistas, no les vamos a achacar nuestras deficiencias (incluida la falta de imaginación), ni los vamos a hacer responsables de nuestros errores, ni mucho menos los vamos a perseguir por ser quienes son.  Es más, les cuento que varios invitados en agosto cancelaron porque, dijeron, no podían compartir el aula con “jóvenes anarquistas, andrajosos, punks, aretudos y llenos de tatuajes”, que esperaban (los que no son jóvenes, ni anarquistas, ni andrajosos, ni punks, ni aretudos, ni llenos de tatuajes) una disculpa y que se depurara el registro.  Siguen esperando inútilmente.
Lo que les queremos pedir es que, en el momento del registro, entreguen un texto, máximo de una cuartilla de extensión, donde respondan a las críticas y acusaciones que se les han hecho en los medios de paga.  Dicho texto será publicado en una sección especial de nuestra página electrónica (enlacezapatista.ezln.org.mx) y en una revista-fanzine-como-se-diga próxima a aparecer en el mundo mundialmente mundial, dirigida y escrita por indígenas zapatistas.  Será un honor para nosotr@s que en nuestro primer número esté su palabra junto a la nuestra.
¿Eh?
Sí, sí se vale una cuartilla con una sola palabra que abarque todo el espacio: algo como “¡MIENTEN!”.  O algo más extenso como “Les explicaría lo que es el Anarquismo si pensara que van a entender”, o “El Anarquismo es incomprensible para los enanos de pensamiento”; o “Las transformaciones reales primero aparecen en la nota roja”; o “Me cago en la policía del pensamiento”; o la siguiente cita del libro “Golpes y Contragolpes” de Miguel Amorós: “Todo el mundo debería saber que el Black Bloc no es una organización sino una táctica de lucha callejera similar a la “kale borroka”, que una constelación de grupos libertarios, “autónomos” o alternativos, venía practicando desde las luchas de los squats (“okupaciones”) en los años 80 en varias ciudades alemanas” y agregar algo como “si van a criticar algo, primero investiguen bien. La ignorancia bien redactada es como una idiotez bien pronunciada: igual de inútil”.
En fin, estoy seguro de que no les faltarán ideas.
TERCERO.- Una no tan mala noticia: les recuerdo las fechas y la forma de solicitar su invitación y pedir su registro:
Fecha de segunda vuelta de la escuelita:
Registro el 23 y 24 de diciembre del 2013.
Clases del 25 de diciembre y hasta el 29 de diciembre de este año.  Salen el día 30.
Y los que quieran quedar a la fiesta del 20 aniversario del alzamiento zapatista, para festejar y acordar el amanecer del 1 de enero de 1994, con fiesta el día 31 de diciembre y el 1 de enero.
Fecha de tercera vuelta de la escuelita:
Registro el 1 y 2 de enero del 2014.
Clases del 3 de enero al 7 de enero del 2014.  Salen el día 8 de enero de 2014, regresando cada quien en sus rincones.
Para pedir su invitación y su registro, mandar un correo a:
CUARTO.- Otra no tan mala noticia es que se supone que yo iba a abrir esta etapa con un texto muy otro, saludando a nuestr@s muert@s, al SubPedro, al Tata Juan Chávez, a la Chapis, a los infantes de la guardería ABC, al magisterio en resistencia, y con un cuento de Durito y el Gato-Perro. Pero como me dijeron que urgía lo de las cuentas y la ratificación de las fechas, pues será para otra ocasión.  Está visto: lo urgente no da tiempo para lo importante.  Así que se libraron de leer sobre cosas que no son “trascendentes-para-la-presente-coyuntura”… por ahora.
Vale.  Salud y, créanlo o no, el mundo es más grande que el titular mediático más escandaloso.  Cuestión de ampliar el paso, la mirada, el oído… y el abrazo.
Desde las montañas del Sureste Mexicano.
El SupMarcos.
Conserje de la Escuelita y encargado de dar malas noticias.
México, noviembre del 2013.
:::::::::::::::::::::::::::::
Escucha y ve los videos que acompañan este texto:
Kenny Arkana con este rap titulado “V pour Verités” (“V de Verdades”). En una parte dice: “benditos sean los que se interponen, los que construyen otra cosa”.



---------------------------------------------------------------------------------------------------------

Fragmento de la película “V de Venganza” sobre la relación entre el miedo y la obediencia, y otra forma de entender las palabras “justicia” y “libertad”.







----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

Pedro Infante con la canción “Yo soy quien soy”, de Manuel Esperón y Felipe Bermejo, en la película “La Tercera Palabra” con Marga López, Sara García y Prudencia Grifell, 1955, dirigida por Julián Soler. Lo pongo nomás por joder a quienes nos quieren hacer a su modo y moda.






_______

Texto/matéria publicados originalmente em http://www.brasildefato.com.br/node/26488



segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Conjuntura da Semana. O mal-estar que exala das ruas

Conjuntura da Semana. O mal-estar que exala das ruas
A análise da Conjuntura da Semana é uma (re)leitura das Notícias do Dia publicadas diariamente no sítio do IHU. A análise é elaborada, em fina sintonia com o Instituto Humanitas Unisinos – IHU, pelos colegas do Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores – CEPAT, parceiro estratégico do IHU, com sede em Curitiba-PR, e por Cesar Sanson, professor na Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN, parceiro do IHU na elaboração das Notícias do Dia.
Sumário:
O mal-estar que vem das ruas
Ressentimento e indignaçãoMutismo da políticaLimites do modelo neodesenvolvimentistaPeriferia. Polícia chega antes que políticas públicasA esquerda não sabe lidar com o movimento
Conjuntura da Semana em frases
Ressentimento e indignação
Um mal-estar vem das ruas. Quando menos se esperava e quando muitos pensavam que a ‘questão social’ estava bem encaminhada e até mesmo resolvida – mobilidade social crescente de milhares para cima –, as ruas dão o recado que as coisas não estão bem.
Um caldo de ressentimento percorre as ruas. Algo estava encoberto sob a superfície. Algo como: ‘eu fiquei de fora, agora eu quero o meu’, comenta o sociólogo Werneck Vianna. Há um clima de frustração dos que não se sentem incluídos na sociedade de consumo, dos milhares que trabalham em empregos precários, dos que estudam e trabalham e precisam se deslocar nas metrópoles carrocentristas, mas também dos que não estudam e não trabalham e se dão conta de que o prometido atalho à sociedade de consumo não chegará pela educação e menos ainda pelo emprego de salário mínimo.
Ao ressentimento junta-se também a indignação pelo não acesso, ou acesso restrito, a serviços importantes como saúde, educação, saneamento, moradia, transporte público... esse último estopim das manifestações de junho – “O Brasil cresceu muito rápido, teve êxitos consideráveis, mas este Estado não foi capaz de oferecer cidadania”, diz Werneck.
O mal-estar das ruas sinaliza que o modelo de inclusão via mercado de consumo – a aposta lulista/dilmista – se tornou insuficiente. Segundo Werneck Vianna, “duas décadas de uma política que hipotecou a sorte do moderno à modernização (...) obstou o acesso à participação política dos filhos dos seus próprios sucessos econômicos, recomendando-lhes que usufruíssem as delícias do consumo. A recomendação valia para todos, mas o desfrute, é claro, teria de ser duramente diferencial”.
Por toda parte diz o sociólogo, “larva a síndrome do ressentimento, especialmente nos jovens e em todos os que não se sentem reconhecidos em seus direitos e identidades, a sensação de uma exclusão injusta porque, embora se sintam formalmente convidados pelas nossas instituições e pelo discurso oficial a participar do festim dos êxitos da modernização econômica do País, esbarram na estreiteza das portas que dão acesso a ele”.
O mutismo da política
Frente ao ressentimento e a indignação do mal-estar que vem das ruas, o mundo da política – os governos estaduais, o Palácio do Planalto, os partidos e até mesmo movimentos sociais conhecidos –, olham com perturbação e certa incredulidade para o que acontece. Um fosso se abriu entre as ruas e a representação política e institucional. Como afirma o sociólogo Werneck Vianna os nossos políticos "não aprenderam nada, nem esqueceram nada com as jornadas de junho".  
Depois de um átimo em que foram sacolejados pelas ruas, retornaram ao lugar comum do fazer político em seus conchavos, articulações e alianças que não levam em conta o ruído de baixo.
Tomaram um susto diz Francisco de Oliveira. Comenta o sociólogo: “Assustaram os donos do poder, e isso foi ótimo. Isso é que é importante. Esse objetivo foi cumprido. Eu falava que era inédito porque a sociedade brasileira é muito pacata. A violência é só pessoal, privada, o que é um horror. Quando vai para a violência pública, as coisas melhoram. Esse é o resultado que nos interessa: um estado de ânimo da população que assuste os donos do poder".
Os donos do poder se assustaram, mas ficou nisso. A presidente Dilma retornou ao papel de gerente do PAC. É incapaz de gestos mais ousados. Como afirma Francisco de Oliveira, “gerente é o antípoda da rebeldia”. Na opinião do sociólogo, “uma gerentona que sabe administrar. É péssimo. O Brasil não precisa de gerentes. Precisa de políticos que tenham capacidade de expressar essa transformação e dar um passo a frente”.
 
Os partidos, por sua vez, não estão nem aí. Até mesmo quem se anunciava como novidade na política optou por camin hos tradicionais ao se aliar com quem se diz socialista, mas ao mesmo tempo corteja abertamente o agronegócio. O PT que já foi o partido das ruas se preocupou muito mais com o seu Processo de Eleição Direta - PED, que reproduz os velhos vícios da política tradicional, do que o esforço em interpretar e dar respostas às ruas.
Um subproduto das ruas, a Reforma Política, depois de solenemente anunciada virou pó. Em menos de 48 horas, a proposta de Assembleia Constituinte virou Plebiscito, transitou para Referendo e sumiu da agenda política do executivo e do Congresso.
A política brasileira tem se transformado na arte do silêncio, diz Vladimir Safatle. “Arte de passar em silêncio sobre democracia direta, como pagar dignamente professores, como implementar uma consciência ecológica radical, como quebrar a oligopolização da economia, como taxar mais os ricos e dar mais serviços aos pobres. Mas também a arte de tentar silenciar descontentes (...) Nesse contexto de mutismo, a violência aparece como a primeira revolta contra a impotência política”, afirma Safatle.
No geral os governantes “reduziram o tom da soberba, da certeza de suas eleições e popularidades, tidas por garantidas, mas não fizeram quase nada. Assustaram-se. Desfilaram promessas e complacência por um lado, e por outro determinaram a mais dura repressão às ruas”, destaca Bruno Cava.
Em vez de aproveitarem a onda como destaca Giuseppe Cocco, e radicalizarem a democracia, os governantes se colocaram mais contra ela do que a favor. Em vez de procurarem compreender o recado das ruas, os poderes instituídos sugerem enquadrar os que nela estão.
A esquerda não entendeu o movimento. Segundo Safatle, “ao perguntarmos sobre o que pode significar a constância, cada vez maior na política brasileira, de fenômenos violentos como esses, duas grandes explicações são fornecidas”. A primeira, diz ele, e “mais clássica gostaria de nos levar a acreditar que estaríamos diante de simples atos de vandalismo, normalmente feitos por jovens proto-delinquentes inebriados por seus delírios narcísicos de onipotência e infiltrados em meio a manifestantes de boa vontade”. A segunda continua o filósofo “é o mero resultado da inversão de sinais, fornecendo-nos uma visão romanceada daqueles que responderiam à violência policial com uma violência legítima”. Melhor seria, entretanto, diz “se procurássemos analisar tal violência como um profundo sintoma social da vida política nacional c ontemporânea”. Uma resposta ao mutismo da política.
Para Safatle, “já há algum tempo, a política brasileira tem expulsado muita coisa de seu interior. Tendendo, cada vez mais, a se limitar a discussões gerenciais sobre modelos relativamente consensuais de gestão socioeconômica (vide o debate recente sobre o dito ‘tripé econômico’, do qual ninguém parece discordar), ela perde a possibilidade de mobilizar populações por meio de alternativas não testadas e que ainda contenham um forte potencial criativo”. Assim, conclui, “ela [a política] perde também a capacidade de acolher demandas que, mesmo sendo urgentes, sempre colidem com boas justificativas tecnicistas para serem deixadas para mais tarde”.
Limites do modelo neodesenvolvimentista
O mal-estar das ruas indica que há problemas com o modelo neodesenvolvimentista.  Na análise de Ivo Lesbaupin, “os governos do PT indubitavelmente deram mais atenção ao social que os governos anteriores, como o aumento real do salário-mínimo e o programa Bolsa-Família, e reduziram fortemente o desemprego. A política externa é mais independente e também solidária com os governos progressistas de outros países da América Latina. E poderíamos citar uma lista de avanços ocorridos nos últimos dez anos, avanços que devem ser mantidos e devemos apoiar”.
Porém, diz ele, “se examinarmos mais de perto, o que nos impressiona não são as diferenças com os governos anteriores, são as semelhanças – cada vez maiores, à medida que o tempo passa”. Segundo o sociólogo, “o governo FHC é considerado uma ‘herança maldita’, mas a política econômica que privilegia o capital financeiro permanece de pé: os bancos tiveram mais lucros nos governos do PT do que antes”.
Segundo Lesbaupin, “não foi feita nenhuma reforma estrutural nas estruturas geradoras da desigualdade no país, no entanto, foram feitas reformas estruturais para atender aos interesses do capital, como a reforma da previdência do setor público, aprovada no primeiro ano do governo Lula”.
Para o professor da UFRJ, “se queremos saber para quem o governo trabalha, temos de examinar o orçamento realizado: para onde estão indo os recursos? Os recursos do país são destinados fundamentalmente ao pagamento da dívida pública, interna e externa, e de seus juros”. Continua ele: “O orçamento realizado de 2012 mostra que 44% do nosso dinheiro foi usado para os juros, amortização e rolagem da dívida, enquanto que apenas 5% para a saúde e 3% para a educação. Em suma, o destino de quase metade do orçamento é a pequena camada mais rica do país – que são aqueles que recebem os juros da dívida -, além dos credores externos. Cada décimo de aumento dos juros pelo Banco Central significa maiores ganhos para os que já são muito ricos”.
Portanto, conclui, “o primeiro setor cujos interesses são atendidos é o capital financeiro (bancos e investidores financeiros), o segundo setor cujos interesses são atendidos é constituído pelas grandes empreiteiras e há ainda um terceiro setor que tem recebido muito apoio do governo: o agronegócio. O governo ajuda a agricultura familiar, sem dúvida, mas a proporção é de 90% para o agronegócio e 10% para a agricultura familiar”.
Para Ivo Lesbaupin é uma ironia atribuir às ruas a ameaça de um retorno da direita. "O que traria a volta da direita?", pergunta. "Privatizações? Leilões do petróleo? de áreas do pré-sal? Avanço do agronegócio? Usinas hidrelétricas na Amazônia? Perda de direitos dos povos indígenas? Tropas militares para enfrentá-los? Código Florestal? Plantio de transgênicos? Aumento do uso de agrotóxicos? A não realização da reforma agrária?" E responde: "Tudo isso está sendo feito por este governo".
Segundo o professor da UFRJ, "existe uma direita mais à direita que este governo, sem dúvida”.  Para Lesbaupin esse governo “tem certamente várias políticas louváveis, faz o enfrentamento da pobreza, reduz a miséria, melhora a capacidade de consumo dos pobres com mais crédito”. O problema diz ele, é que “não muda as estruturas geradoras da desigualdade social e, por isso, continua transferindo a maior parte da renda e da riqueza do país para os mais ricos do país e do mundo. E entregando nossas riquezas naturais para o setor privado e as multinacionais. Isso mostra claramente a quem este governo serve em primeiro lugar”.
Na opinião de Paulo Nogueira, pela ótica da esquerda, mais especificamente a esquerda petista, as ruas cometem um pecado mortal, “não dobram os joelhos para reverenciar os avanços sociais realizados pelo PT nos últimos dez anos, na verdade, acham que os avanços foram muito menores do que poderiam e deveriam ser”.
Falando dos Black blocs, diz ele que não é tão difícil assim enxergar os motivos da revolta desses jovens. Comenta: “Veja o que está acontecendo com os índios sob Dilma. Ou o que ocorreu a tantos pobres que tiveram o azar de construir seu casebre num local marcado para receber obras da Copa do Mundo. Agora preste atenção no garoto de 17 anos da Zona Norte de São Paulo que antes de morrer ainda teve tempo de perguntar ao PM que o assassinou por que atirou (...) Quem está cuidando dessa gente toda?”. Segundo ele, “um governo popular tinha que fazer mais”.
Para Perry Anderson as ruas “levantaram a questão da distribuição escandalosamente distorcida das despesas públicas no Brasil”.
O mal-estar das ruas de que nem tudo está bem já vem se manifestando faz tempo. As análises publicadas pelo IHU/CEPAT reiteradamente afirmam os limites do modelo neodesenvolvimentista. Entre tantas, no dia 22 de janeiro, publicávamos a análise de conjuntura intitulada “2013: Uma agenda regressiva? O ano dos movimentos sociais?
Comentávamos na época: “O ano de 2013 anuncia mais do mesmo. O foco central permanece na economia como meio e fim na estratégia governamental de inclusão social. A concepção do modelo em curso sugere a inclusão via mercado. Já não se trata de um modelo de transformação, via reformas estruturais, mas de aderência à lógica produtivista-consumista e mitigação da pobreza via programas e políticas sociais compensatórias”.
Na mesma análise dizíamos que “o cenário para 2013 é o de uma agenda regressiva na área social” e afirmávamos que “a ausência, entretanto, das demandas sociais na agenda do governo ou o tratamento tímido que é dado a essas temáticas, pode desaguar numa retomada das lutas sociais”. Concluíamos com a afirmação que “2013 sinaliza para o ascenso das lutas sociais”. Cinco meses depois, grandes manifestações tomavam conta das ruas.
Polícia chega antes que políticas públicas
A violência dos Black Blocs, por outro lado, trouxe à tona a escalada da violência praticada pelo Estado em sua versão armada - as polícias militares, particularmente nas periferias das grandes metrópoles. O que aconteceu com Amarildo e o que aconteceu com o jovem adolescente Douglas Rodrigues são faces de uma mesma moeda.
Travestidas como acidentes, o fato é que a violência e a morte tem uma estranha predileção etária, étnica, social e geográfica: as vitimas são sempre jovens, negros ou pobres e moradores de periferias”, afirma Douglas Belchior.
Os jovens de periferia, comenta Renato Rovai “não querem mais ver irmãos, parentes, amigos, colegas ou apenas conhecidos, serem enterrados porque cometeram o crime de terem nascido, em geral negros, e viverem nas periferias. Eles estão dizendo chega. E a nossa democracia, sim, democracia, não tem dado conta de resolver esse problema. E eles perderam o medo de perder a vida se necessário for para mostrar que não irão bovinamente para covas rasas de cemitérios. Assassinados por polícias que deveriam preservar suas vidas. E vitimados por um Estado que não lhes garante futuro e nem paz”.
A força bruta chega antes que as políticas públicas. Ilustrativa a entrevista de José Cláudio Alvespara o IHU analisando o caso das Unidades de Polícia Pacificadora –UPPs. Comenta que as UPPs camuflam a violência e a sua versão social praticada é ridícula. Segundo ele para alterar a atual situação das favelas “Ã © preciso investigar a constituição dessas comunidades, como atuam, qual é o grau de escolaridade, de saúde, de urbanização, de acesso à cultura que elas têm, e não só falar de ‘culturazinha’, de bater lata, de dançar, de tocar violino para dizer que os moradores são cultos. Essas ações são inúteis. Tem de fazer um conjunto de ações que elevem essas pessoas a outro patamar de cidadania, de atuação política, cultural e econômica, a qual tenha condições de se confrontar com essa estrutura criminosa que se perpetua”.
O ataque aos símbolos do capitalismo e aos prédios do Estado promovido pelos Black blocs e também por jovens que se reúnem em grupos diversos também podem ser interpretados como ressentimento daqueles que não se veem inseridos no sistema e contra um Estado, que do qual conhecem apenas o seu truculento braço armado.
A esquerda não sabe lidar com o movimento
O mal-estar que vem das ruas pode ainda ser interpretado pela confusão que criou na esquerda. Trata-se de um novo tipo de movimento que foge aos esquemas tradicionais. A esquerda fordista – hierarquizada, padronizada – estranha a ausência de pautas claras, de lideranças definidas, da ‘ação coletiva’ caótica.
Um líder sindical num debate – no encontro da Abet (Associação Brasileira de Estudos do Trabalho) em outubro em Curitiba – afirmou que as manifestações sindicais, a passeata, obedecem a uma lógica. O início é o momento da concentração, da aglutinação; o meio é momento propagandístico das reivindicações e o final é o lugar das falas dos dirigentes.
Esse esquema as jornadas de junho implodiram. Os protestos de junho apresentam uma nova configuração que oscila entre processo e resultado.
Como destaca Pablo Ortellado a grande novidade é que temos assistido “o nascimento de movimentos horizontais na forma de organização e autônomos em relação a partidos e instituições. Esses movimentos frequentemente valorizam mais o processo do que o resultado: é o meio pelo qual atuam, a horizontalidade, a democracia direta, assim como a criatividade das suas ações, que dão a eles sabor e sentido. As lutas são ao mesmo tempo experiências vivas de uma democracia comunitária e espaço de autoexpressão contracultural”.
Segundo ele, “a dupla vitória de reduzir o custo das passagens e trazer para a centralidade do debate político a tarifa zero por meio de uma ação autônoma com uma estratégica clara é o mais importante legado dos protestos de junho”.
Para o ativista e professor na Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP “não se trata apenas um novo paradigma para as lutas sociais no Brasil, mas um modelo de ação que combina a política horizontalista e contracultural dos novos movimentos com um maduro sentido de estratégia".
Em sua opinião, “durante muitos anos, os novos movimentos viveram sob uma tensão entre processo e resultado. A experiência dos protestos de junho deixa dois legados opostos: o da mais extrema dispersão processual e o da fértil conjugação de processo e resultado na luta contra o aumento”.
Estamos diante de uma bifurcação afirma Cocco. Para ele, as jornadas de junho apresentam algumas lições: “A primeira [lição] é que nenhuma das formas tradicionais de organização, sejam elas partidárias, sindicais ou de movimentos organizados, sabe lidar com essa nova dinâmica. A segunda lição, comenta, “é entender antes de fazer críticas ou constatações de desqualificação, de apologia, até criminalizadoras às vezes”. A terceira lição conclui “é que as formas representativas, sobretudo os partidos, quando participam de algum momento da dinâmica de governo, ou se abrem para a onda entrar ou vão ser deslegitimados”.

As jornadas de junho não terminaram. O mal-estar das ruas menos ainda.